sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

ASAMG - Do outro lado do mundo

Depois das férias no Brasil, passei uns dias em casa em Barcelona, cuidando de assuntos vários e vendo os amigos, e no sábado fui para Londres. Era apenas uma primeira parada, de um só dia, antes de começar uma viagem pela Ásia e Oceania. Agora escrevo de Tóquio, onde cheguei na segunda-feira. Quem não me conhece pode estar se perguntando: "Pô, esse cara não trabalha?" Trabalho há mais de vinte anos, mas em 2008 estou me permitindo desfrutar de um ano sabático. O objetivo é ler muito, escrever muito e viajar bastante.

Devo reconhecer que o Japão nunca foi um país que tenha atraído muito a minha atenção. Claro que tudo que acontece aqui importa muito, sendo a segunda maior economia do planeta e sede de algumas das mais importantes companhias do mundo. Além do mais, muitas das modas que a cada três por quatro invadem as escolas de negócio e mudam o dia-a-dia das empresas foram primeiro criadas e implementadas por empresas japonesas. Sendo eu executivo, tudo isso me interessa há anos e tem um impacto direto sobre o meu trabalho. No entanto, minha vida profissional sempre esteve mais enfocada ao mundo ibero americano ou Europeu e profissionalmente o meu contato com o mundo Asiático sempre foi indireto. Do Japão o que mais ouvia era a queixa dos meus colegas quando tinham que vir a negócios para cá. Tóquio definitivamente não é um dos destinos mais apreciados entre os executivos internacionais.

A decisão de incluir o Japão nesta viagem foi o resultado de um impulso: o tipo de bilhete que comprei permitia incluir uma parada aqui a caminho da Nova Zelândia. Porque não fazê-lo? Foi assim que nasceu a idéia de vir arriscar-me sozinho em um país do qual sei muito pouco, onde não só não falo a língua como não tenho a menor possibilidade de ler nem uma palabra sequer em qualquer coisa coisa escrita que encontre pela frente. Enfim, um lugar onde sou um completo analfabeto. Claro que arriscar-me é um verbo inadequado, ao menos em comparação com o contexto latino americano: quem vai para uma grande cidade latino americana está arriscando seus bens e sua vida. Aqui, nem uma coisa nem outra, sendo o nível de criminalidade ridiculamente baixo e a sensação de segurança nas ruas uma companheira constante, a qualquer hora do dia ou da noite, em qualquer lugar.

Comecei a gostar da cidade logo ao desembarcar: o aeroporto de Narita é moderno, funcional e tranqüilo, o oposto do caos de Cumbica e tantos outros aeroportos pelaí. Tinha um ônibus que me levava direto do terminal onde desembarquei até a porta do meu hotel. Não é que tenha ficado em um hotel grande ou muito conhecido, é que há várias linhas neste estilo, que passam pelos principais hotéis de diferentes bairros. Mais fácil impossível! O trajeto do aeroporto ao centro de Tóquio durou uma hora e dez minutos, sem nenhum engarrafamento de trânsito. Fez-me pensar que agora que o Governo estuda a possibilidade de construir um novo aeroporto em São Paulo, a distância entre o novo local e o centro da cidade não precisa ser a variável fundamental. Se houver meios de transporte eficientes, a distância é secundária. Seguramente voltarei a este tema, porque sou defensor árduo de que fechem em menos de dez anos o aeroporto de Congonhas e o transformem num parque, mas isso também é tema para outra ocasião.

Estando aqui refleti muito sobre o tema da semana passada: o crescimento demasiado rápido de São Paulo e os problemas da cidade. A área metropolitana de Tóquio tem mais de vinte milhões de habitantes, sendo a primeira megalópoles do planeta. Isso porque inclui Yokohama, outro monstro de cidade. Mas Tóquio só tem um milhão a mais de habitantes que São Paulo. É verdade que a evolução demográfica foi totalmente distinta e eles não estavam permanentemente correndo atrás do prejuízo: em Tóquio já havia 7,3 milhões de pessoas em 1940 e em 1947, depois da Guerra, eram 4,2 milhões. Mas aqui o que se vê é que é possível construir uma cidade moderna, limpa, funcional, segura, com um trânsito bastante aceitável e onde vivam mais de dez milhões de habitantes. Claro que a diferença está na grana: o Japão é a segunda maior economia do mundo e dispor de dinheiro para investir ajuda muito.

Gostei muito da cidade e ela serviu para me fazer pensar no que São Paulo poderia ser um dia. Mas também tenho que admitir que, subindo ao alto de três pontos de observação, a Torre de Toquio, Roppongi Hills e o prédio da prefeitura em Shinjuku, o que se vê é desconcertante: uma aglomeração urbana que parece não ter fim. A foto ao lado dá apenas uma pálida idéia. Fica difícil não pensar que, por muito que tudo funcione bem, mesmo assim é gente demais num único espaço. Não sou ninguém para opinar se para os japoneses uma megalópoles é bom ou ruim, mas de coração sigo desejando que este não seja o futuro da cidade onde nasci, mesmo que um dia tudo funcione bem por lá também!

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

ASAMG - Menos é mais

Na semana passada voltei de quase seis semanas de férias no Brasil. Cheguei a São Paulo durante os feriados de final de ano, saí na quarta-feira de cinzas, final do feriado de carnaval. Em ambas ocasiões, milhões de pessoas a menos na cidade. Que maravilha! Assim até dá gosto passar férias lá. Só me convence ainda mais de antiga opinião: Sampa só tem jeito se ficar menor, com menos população.

Faz mais de uma década que a cidade está parando de crescer. Se bobear, o próximo censo vai confirmar que já parou. A área metropolitana ainda mantém a inércia, mas também cresce cada vez mais lentamente. A ONU prevê que até 2015 São Paulo será uma das megalópoles do planeta, áreas metropolitanas com mais de vinte milhões de habitantes. Hoje em dia só Tóquio alcançou esta marca. Os mexicanos provavelmente discordarão, pois mexicano adora dizer que o DF tem mais gente do que na realidade tem. Já vi até estatística dizendo que já seriam 25 milhões, mas isso é seguramente exagero.

É engraçado porque essa mania de grandeza é típica de povo subdesenvolvido, achar que tamanho importa. Eu sou de uma geração que cresceu na década de setenta ouvindo que São Paulo era a cidade que mais crescia na América Latina e que não podia parar de crescer. Na década de oitenta nos orgulhávamos de ser uma das quatro maiores cidades do mundo. Era moda fazer comparações absurdas com Nova York. O hobby de muitos paulistanos famosos era dizer nas entrevistas que gostava tanto de Sumpaulo como de Noviorque. E na platéia muita gente acreditava… Para quem a vida toda ouviu essas cocorocadas é difícil defender que quanto menor melhor - ou seja, que São Paulo deveria deixar de crescer. Mas na verdade essa é a única saída para a cidade.

Não se trata de dizer que os pobres devem ir embora. Tampouco há que expulsar ninguém. Segundo uma pesquisa do IBOPE publicada em janeiro, mais de 60% dos habitantes sairiam de São Paulo se pudessem. Os que ficam alegam que não têm opção. Onde estão os partidos políticos e governos trabalhando em busca de alternativas? Devíamos dar uma forçinha para os que querem se mandar. É lógico que essa gente não iria desaparecer, iria demandar infra-estrutura em outro lugar. O truco do almendruco é incentivar que mudem para lugares onde é mais barato e mais viável proporcionar esses serviços.

São Paulo cresceu demais da conta. E rápido demais também. Continuamos pagando o preço desse exagero. Em 1950 a cidade tinha 2,2 milhões de habitantes. Imagina que delícia: só dois milhões de almas! Em 1991 eram 9,6. Em quarenta anos a cidade cresceu mais que dois Berlins inteiros, ocidental e oriental, mais que quadruplicou seu tamanho. Com números dessa magnitude, não há como fazer milagres na infra-estrutura. O pior é que se nos últimos 16 anos a população "só" cresceu 1,2 milhões de habitantes, a sensação de caos piorou desproporcionalmente: o trânsito encravou de vez, o metrô está colapsado, as pessoas que têm dinheiro se movem em helicópteros e carros blindados, a violência transformou a cidade que era relativamente segura em assustadora.

Não basta parar de crescer, tem que diminuir! Em muitos lugares na Europa essa é a tendência das grandes cidades. Pode ser que nós também cheguemos lá, mas deixar as forças demográficas atuarem sozinhas é muito pouco inteligente, principalmente tendo em vista que o aumento do poder aquisitivo dos mais pobres, que vem acontecendo desde o fim da malfadada Nova República, levará a maior uso de infra-estrutura e nós continuaremos correndo atrás do atraso. Se a população não crescer, mas o número de carros na rua sim, porque mais gente tem dinheiro para comprá-los, piorarão os congestionamentos. E assim por diante. O melhor seria encontrar a maneira de que em duas décadas voltássemos a ter menos de nove milhões de habitantes, que já é gente pra dedéu. Para isso primeiro é preciso aceitar que Sampa tem que parar e dar uns quantos passos atrás. Nesse nosso país onde tanta gente pensa por chavão e as velhas idéias parecem não caducar jamais, talvez seja pedir demais!

Cada feriado prolongado está nos demonstrando como seria melhor a vida com menos gente no formigueiro. Foi o que se viu no Natal e no Carnaval. E o melhor dessa pax paulistana foi que os motoqueiros desertaram a cidade. Como o trânsito fica mais tranquilo sem eles! Ao mesmo tempo, como o trânsito ficaria pior se todos os motoqueiros passassem a andar de carro! Ruim com eles, pior sem eles, mas isso é assunto para outra oportunidade.