Nas duas últimas décadas tive muitas oportunidades de viajar. Conheci muita gente pelo caminho e os seus conhecimentos sobre o Brasil variavam enormemente. Quando as pessoas não sabiam absolutamente nada sobre o país, ao menos uma palavra conheciam: Copacabana. Para mim sempre foi a confirmação de que o nosso maior ativo é o Rio de Janeiro - e prova da burrice extrema que é deixar a cidade degringolar durante décadas a fio.
Algumas pessoas sabiam muito sobre o Brasil. Mas mesmo estas cedo ou tarde acabavam associando o país a carnaval ou futebol. Pelé, aliás, é a segunda palavra mais mencionada pelos que sabem pouco ou nada sobre nós. Ser o país do carnaval e futebol não é só nossa imagem externa, é também nossa visão do Brasil, explícita ou implicitamente.
É curiosa essa atitude, pois não deixa de ser esquizofrênica: ao mesmo tempo que levamos na piada visões otimistas sobre o nosso futuro (o Brasil só tem tamanho e sacanagem; é um gigante deitado eternamente em berço esplêndido etc), também estamos convencidos que somos um povo e um país especial, abençoado por Deus e bonito por natureza. Oscilando entre uma coisa e outra, falta ao Brasil e ao brasileiro uma visão de futuro, um projeto de país, uma imagem na qual nos vejamos refletidos e com a qual estejamos razoavelmente satisfeitos.
O Brasil já foi classificado como terceiro mundo, país subdesenvolvido, em desenvolvimento, emergente e mais recentemente como parte do BRIC, que é uma liga especial entre os emergentes. Acho que todos gostaríamos de ser um país rico e desenvolvido. Não sei quantos acreditam que isso seja possível, mas não tenho a menor dúvida de que há enorme variação de opiniões sobre como chegar lá.
Apesar do século XX ter demonstrado que o capitalismo é o sistema econômico que produz mais riqueza e mais rapidamente entre todos que o ser humano já inventou, há muita gente que advoga pelo socialismo; apesar do capitalismo funcionar mal no país, travado pelos privilégios cartoriais, mal funcionamento do estado, insegurança jurídica, nosso absurdo sistema fiscal, excesso de empresas estatais e um largo etcétera, há quem seja contra o mercado, a concorrência, a iniciativa privada e o lucro; apesar de necessitarmos tanto do capital como da tecnologia estrangeira, há quem veja o estrangeiro com desconfiança, com a idéia primitiva de que só querem espoliar o país, esquecendo-se que é melhor dividir os ganhos do que não ganhar.
Há tanta divergência sobre como alcançar o desenvolvimento, que há até economistas que se etiquetam como "desenvolvimentistas". Economista "desenvolvimentista" é duplamente kafkiano: primeiro, porque dá a entender que haja economistas que sejam contra o desenvolvimento, o que na verdade não existe; segundo, porque as receitas dos "desenvolvimentistas" são as que a longo prazo criam menos desenvolvimento e mais miséria. Nos próximos dez anos Venezuela, Argentina e Equador serão exemplos cristalinos dessa realidade.
Entre 2003 e meados de 2008 presenciamos o período de maior prosperidade na história da humanidade. Nunca antes o PIB per capita mundial tinha crescido tanto por tanto tempo (credo, "nunca antes" parece o Lula se auto-elogiando). Essa incrível onda de prosperidade não só permitiu que dezenas de países emergentes crescessem aceleradamente, como derrubou um dos mantras que pretensamente explicava porque o primeiro mundo era rico e o terceiro e quarto pobres: dizia a lenda que os países ricos compravam por preços cada vez mais baratos os recursos naturais dos países pobres. Na recente prosperidade os preços dessas matérias primas em alguns casos triplicou, o que ajudou enormemente na prosperidade dos emergentes exportadores desses materiais.
Agora a crise mundial está revertendo a situação e a marolinha do presidente Lula ou a gripinha da ministra Dilma estão se revelando um problema sério, com muitas chances de levar o país à recessão. Pululam os gurus pregando o fim do capitalismo, imprecando contra o mercado, advogando a intervenção estatal. A crise mundial é séria, seriíssima. Está destruindo muito da riqueza criada anteriormente. Está expondo o que funcionava mal na economia globalizada. Pode durar muito mais do que a maioria ousa imaginar. Mas não é o fim do mundo. Tampouco é o fim do capitalismo. Nem sequer será o fim da economia de mercado.
Apesar de não podermos mais surfar na onda da prosperidade internacional, o Brasil continua sendo um país viável, com enorme potencial de ser um país desenvolvido no futuro. Mas para sê-lo, primeiro temos que querer; depois precisamos acreditar que é possível; por fim é preciso escolher o caminho certo para lá chegar. É perfeitamente possível sonhar com um Brasil rico e desenvolvido no ano 2050. Para isso precisaríamos ter uma visão de país, valores inegociáveis e uma estratégia de desenvolvimento. Um espelho em que todos nos reconhecêssemos e ao mesmo tempo nos diferenciasse dos demais. Não vejo nada disso nas discussões que andam pelaí. É uma pena. Já dizia Sêneca, quem não sabe para onde quer navegar, nenhum vento lhe é favorável.
quinta-feira, 25 de junho de 2009
Assinar:
Postagens (Atom)