quarta-feira, 7 de outubro de 2009

ASAMG - Os Jogos Que Faziam Falta

Na semana passada o Comitê Olímpico Internacional elegeu o Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Provavelmente foi a melhor notícia para a cidade desde que JK teve a péssima idéia de construir Brasília. A História muitas vezes é parteira de ironias: um dos poucos bons presidentes que o país produziu tomou a pior decisão da República: a transferência da capital. Os membros do COI reunidos na Dinamarca, por sua vez, tomaram outra decisão que pode marcar a reversão de cinco décadas de decadência do Rio. O mal feito por um brasileiro pode ser amenizado pela deliberação de estrangeiros.

Muitas vezes, ao longo de anos, escrevi e defendi a idéia de que o Rio de Janeiro é a marca mais conhecida do Brasil no exterior. A cidade que um dia fez sonhar o mundo inteiro. Um sinônimo um pouco difuso de uma felicidade quase que de paraíso perdido. Sempre acreditei que permitir que o Rio passasse pela longa decadência que tem passado, chegando a acumular os problemas que acumulou, era prova de imensa burrice (mais uma vez, exclusivamente nacional, de nenhuma forma imposta desde fora). O Rio de Janeiro não é só dos cariocas, é de todos os brasileiros. Os problemas deles são de todos nós. Deixar o Rio fenecer é mau para todo mundo.

Curiosamente, parecia que ninguém se importava muito. Na verdade, os próprios cariocas e fluminenses deram uma enorme mãozinha ao desastre, elegendo um atrás de outro os piores governantes possíveis. Chegou a parecer que se tratava de um caso perdido, por muito que doesse no coração de todos que gostamos da cidade e não temos problema em admitir que é o nosso mais potente cartão de visitas pelo mundo afora.

Moro em Barcelona há muitos anos. A primeira temporada que passei por cá foi logo depois dos Jogos Olímpicos de 92. Os catalães foram extremamente hábeis em aproveitar a desculpa do evento para fazer investimentos em infra-estrutura que transformaram completamente a cidade. Até então Barcelona dava as costas para o mar e o seu litoral era mais que degradado. Com a construção da vila olímpica e do anel circular, as Rondas, mudou completamente a dinâmica urbana. Muitos outros investimentos foram feitos. A qualidade de vida melhorou a olhos vista. O sucesso de uns jogos muito bem organizados fizeram o resto para ajudar a torná-la uma das cidades mais populares e agradáveis da Europa.

Para o Rio, ser eleita sede das olimpíadas pode ser o fator decisivo para as mudanças que a cidade tanto necessita. Os investimentos diretos para a realização dos jogos dinamizarão a economia local e deixarão um legado duradouro. Pode ser também a grande oportunidade para limpar a má fama adquirida nas duas últimas décadas graças aos crônicos problemas de violência urbana, pobreza e narcotráfico. O Rio pode voltar a ser, a partir de 2016, uma cidade com a qual sonhar. É uma oportunidade de ouro que esperamos seja muito bem aproveitada.

Para que isso ocorra seria necessário que os investimentos fossem muito além dos especificamente necessários para sediar as olimpíadas. A infra-estrutura da cidade ficou parada no tempo e além de se desgastar, não deu conta do aumento da população. O Rio merece ser passado a limpo com o dinheiro de todos nós. Mais que isso, seria urgente definir que papel se espera da cidade no conjunto do país. Se tivéssemos uma política urbana digna desse nome, com objetivos a longo prazo bem definidos, seria muito mais fácil decidir sobre o que deve ser feito ou não. Mesmo não a tendo, nunca é tarde para promover o debate e gerar idéias.

Na minha opinião, seria bom evitar ações que incentivassem o crescimento populacional - Rio e São Paulo precisam diminuir de tamanho, não crescer. Os investimentos relacionados com água (coleta e tratamento de esgotos, despoluição da baía da Guanabara, proteção de mananciais, etc.) deveriam ser priorizados, assim como a proteção da mata e das encostas - um tema espinhoso por causa das favelas. Também poderia ser a altura certa para recuperar a memória histórica da antiga capital do Império. A República fez de tudo para apagar os traços das décadas de monarquia, como se a mesma não fosse parte do nosso passado. Há absurdo maior do que a Quinta da Boa Vista, antiga residência do imperador, ser um museu de história natural? Quem a visita não encontra nenhuma informação sobre seu uso no século XIX. Por fim, há na cidade um exagerado contingente militar que poderia fazer sentido quando era a capital do país, mas que hoje em dia é mais que questionável.

Também acho preocupante a tendência de basear o conteúdo das mensagens relacionadas com as Olimpíadas na idéia de país do samba e do carnaval. Esse chavão tem um especial apelo no Rio. No entanto, essa imagem do Brasil está mais que ultrapassada. Seria muito melhor nós nos projetarmos como uma país solidamente democrático, em pleno desenvolvimento econômico e social e que quer ser a terra da liberdade e da natureza.

Por fim, termino este post com uma sugestão: os cariocas poderiam aproveitar a oportunidade e mudar o nome da Avenida Presidente Vargas para Avenida dos Jogos Olímpicos. Não faz o menor sentido que uma das vias principais da cidade homenageie o ditador mais cruel que o Brasil já teve. Quando acabou a ditadura na Espanha, todas as ruas e avenidas que tinham sido rebatizadas com o nome de Generalísimo Franco recuperaram seu antigo nome, como é o caso da Avenida Diagonal de Barcelona. Hoje ninguém aceitaria que uma avenida na Espanha homenageasse o antigo ditador. Porque no Brasil deve ser diferente? Homenagear Vargas é incompatível com os nossos valores e ideais democráticos. Avenida dos Jogos Olímpicos seria muito melhor. Vive les jeux e parabéns aos cariocas e ao Brasil!