Recentemente estive bastante desconectado das notícias do Brasil. Só de vez em quando entrei na internet para ler algum jornal brasileiro ou algum amigo me contou alguma novidade. Fora isso, só soube o que foi publicado na imprensa européia, que tampouco é muito.
Das notícias que li, a que mais me surpreendeu foi constatar que o índice de popularidade da presidente está em níveis record, mesmo comparando com seu antecessor. Sem nenhuma ironia, não consigo entender porque. Dilma não tem a mesma capacidade de comunicação que Lula; acredito que seria incapaz de dizer uma bobagem só para fazer média com os eleitores, técnica na qual o ex-presidente é expert; se o maior escândalo de corrupção da história não fez dano à imagem de Lula, porque a menor tolerância de Dilma a tornaria popular? Por fim, seis meses depois da sua posse o crescimento econômico passou de 7,5 % ao ano para zero. Até quando ela vai poder continuar surfando nessa onda, antes dela se desfazer na praia?
Comecemos pela economia, sempre meu tema preferido. No ano passado tivemos uma inflaçãozona (6,5 %, limite máximo do objetivo) e um PIBinho, de 2,7 %. Crescer 2,7 % pode até parecer boa notícia, quando comparado com os países ricos. No entanto o crescimento foi todo no primeiro semestre, porque no segundo a economia parou. O Brasil passou de raspão pela recessão técnica. Pior, tudo indica que o primeiro trimestre de 2012 foi de estagnação, e o segundo não deve ser muito melhor. O possível crescimento deve ficar para mais tarde. Que efeito terá sobre as pessoas um ano de estagnação? Será possível manter a sensação de prosperidade?
Hoje já me parece difícil que o crescimento de 2012 seja superior a 3,0%, se é que chega a tanto. Para Dilma é um problema: depois de 2,7 % no ano passado, se em 2012 o crescimento fosse de 3,0%, para chegar à média de 5,0% no seu governo seria necessário crescer 7,2% por dois anos consecutivos. Em princípio já ficou tarde demais.
Pelo que se vê, a aposta governamental é vitaminar o crescimento graças à redução dos juros. A receita é boa, por muitas razões, mas o diagnóstico me parece equivocado. Os juros são um preço como qualquer outro. Se no Brasil são historicamente altos, há que se perguntar porque é assim e atuar sobre as causas. Mexer num preço (ou conjunto de preços) por decreto, por decisão presidencial, é querer mudar o efeito sem atacar as causas. O mais provável é que haja um efeito de curto prazo de aumento do consumo, mas que irá também acompanhado de maior pressão inflacionária. O risco da aposta governamental é que o Banco Central perca a mão no controle da inflação. Achar que a mesma está sob controle é auto-enganar-se, pura lorota. E há um efeito adicional sobre o câmbio: juros menores devem levar a desvalorização cambial. É bom que haja uma correção do cambio, mas não dá para esquecer a pressão que irá gerar sobre os demais preços.
Por fim há sempre a tentação de fazer a economia crescer aumentando os gastos públicos. Foi assim que Lula garantiu seu último ano de mandato. Se Dilma optasse por esse caminho estaria sacrificando a estabilidade de preços. Mais de uma vez escrevi aqui que o dilema inflação ou crescimento não é uma fatalidade, mas para escapar dele é preciso fazer as coisas diferente. A receita para entrar num ciclo virtuoso de crescimento que não seja comandado pela conjuntura externa favorável é conhecida de sobra. É hoje exatamente a mesma que há dez anos, quando Lula começou a governar: reforma tributária, reforma da previdência, privatizações. Perdemos dez anos. Pela ausência desses temas nos noticiários, parece que perderemos ao menos mais dois. E se a presidente deixar se seduzir pelas receitas "desenvolvimentistas" corremos o risco de sacrificar a inflação em prol de um crescimento não sustentável.
Se tudo isso não bastasse, há muitas outras batatas quentes nas mãos da presidente. É muito positivo que ela não seja conivente com os fisiológicos ou corruptos, mas não dá para esquecer que ela foi eleita graças à aliança com esses mesmos corruptos e fisiológicos. Ela precisa do apoio dos seus aliados no Congresso para poder governar. Até quando vai poder manter a linha dura? Como explicar uma possível mudança de postura? Será que sua base aliada será igualmente grande em 2014 como foi em 2010? Nesse quesito há muita gente que opina que a tal CPI do Cachoeira pode ser tão negativa para a situação quanto para a oposição. Um preço alto demais só para desviar a atenção do possível julgamento do mensalão ainda em 2012.
Tampouco o PAC parece que anda bem. Cada vez se fala menos no assunto. Talvez porque o número de obras com grandes atrasos esteja se acumulando. Fica cada vez mais difícil tapar o sol com a peneira. Dilma sempre vendeu a imagem de grande administradora, além de mãe do PAC. Mas se as obras não avançam fica difícil explicar que a culpa não é do governo. O maior risco a curto prazo está ligado com a Copa de 2014. Os amigos com quem converso me dizem que corremos o risco de dar um grande vexame. Seria embaraçoso que ocorresse em ano eleitoral.
Por fim há a conjuntura externa, muito mais complicada que no governo anterior. Sou dos que acreditam que nos últimos dez anos houve uma mudança duradoura na tendência dos preços das matérias primas. Há muitas razões estruturais para defender essa tese. No entanto a tendência de alta a longo prazo não impede que haja flutuações em sentido oposto a curto prazo. 2012 parece que será um ano de queda nos preços das commodities. Um grande problema para países exportadores como o Brasil. Boa parte do nosso crescimento entre 2002 e 2008 foi graças a fatores externos. Neste ano e talvez no próximo não vai dar para contar com eles.
Não vou ao Brasil desde Dezembro, não tenho a menor idéia de como as pessoas vêm o país. Dizem-me que ainda sobra otimismo. Visto de fora, parece que há muita turbulência pela frente. Qual será o índice de popularidade da presidente dentro de um ano? Duvido que continue tão alto.
quarta-feira, 16 de maio de 2012
Assinar:
Postagens (Atom)