Estou passando uma semana de férias no Brasil. Apesar de vir com frequência, sempre há coisas que me surpreendem, positiva ou negativamente. Como quem vive aqui às vezes nem sequer as nota, acho que vale a pena comentá-las:
A primeira grande surpresa, que já é uma velhidade, foi a vitória do "Não" no plebiscito para desmembrar o estado do Pará em vários estados. A idéia era péssima e a conta seria paga por todos os brasileiros. Achava injusto que só os paraenses votassem e confesso que esperava o pior. Os eleitores, no entanto, surpreenderam pelo bom senso e o Pará não vai ser dividido. Se a decisão tivesse ficado nas mãos dos políticos, provavelmente teria acontecido o contrário. No bate-papo da pizza de ontem à noite alguém disse que se o Sarney tivesse interesse na divisão, ele teria dado um jeito dela acontecer. É triste, mas provavelmente meu amigo tinha razão. A política brasileira é cada vez mais impalatável. Mas não vejo sinal de indignados.
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Hoje pretendia ir passar o dia no Rio e visitar uma amiga que há muito não vejo. Como só tenho uma semana de férias, tinha que ser bate e volta: ir de manhã e voltar à noite. Tal e como fazia no passado (e não estou me referindo aos bons tempos da ponte aérea e dos aviões Electra, mas de apenas alguns anos atrás), fui comprar a passagem na hora no aeroporto. Devo ter viajado mais de setenta vezes entre Rio e São Paulo. Nunca tive problema. Hoje, na primeira companhia em que tentei viajar, a passagem custava mais de 2.000,00 reais. Sim senhor, mais de mil dólares, preço de passagem entre a Europa e o Brasil. Na segunda companhia, dita low cost, custava a bagatela de 1.800,00 reais. Evidentemente desisti da viagem, pois não me deixo roubar facilmente.
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Não é preciso ser bruxo para prever que amigos brasileiros dirão que a culpa é minha, pois deveria ter comprado com antecedência pela internet, que seria muito mais barato. É uma maneira de ver as coisas. O que eu vejo é que há dois meses passei pela mesma situação no aeroporto de Barajas, em Madrid. Comprei na hora um bilhete de ida e volta para Barcelona, trajeto comparável a Rio-São Paulo, e custou um terço do pedido hoje em Congonhas. Esse preço absurdo me parece um indicador de que não há suficiente concorrência no mercado. Qual a surpresa, se o país não tem sequer aeroportos? A Espanha, que tem a mesma população que o estado de São Paulo, tem dois mega aeroportos e pelo menos uma dezena de aeroportos regionais maiores e/ou melhores que Congonhas ou Cumbica, os maiores aeroportos do país. Sem aeroporto, como vai haver mercado, concorrência e preço baixo? Até o preço do estacionamento foi muito mais caro do que em qualquer aeroporto europeu que eu conheça. Se ao invés de estar de férias tivesse que viajar a trabalho, teria pago o preço que pediam. É um exemplo claro do tal custo Brasil.
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Onde está o plano do governo para os aeroportos? Ninguém sabe, ninguém viu. Nem a tal privatização vai para a frente. E quando acontecer vai chover pouca - leitura protestando contra a privataria, mesmo que praticada por governo companheiro. A lógica da coisa me escapa completamente!
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Também é verdade que parte do problema decorre do câmbio valorizado da moeda brasileira. O problema não é de hoje e a alta inflação dos últimos anos só agrava a situação. Longe de mim propor medidas artificiais para "corrigir" um preço. Isso é receita de ignorante. Mas é preciso se perguntar porque o cambio está tão valorizado e que distorções provoca na economia brasileira. Depois é preciso agir. Não espero nada nesse sentido da atual equipe econômica instalada em Brasília.
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Ontem fui almoçar com outra grande amiga no Casserole, no centro de São Paulo. É um dos meus restaurantes preferidos. Em Maio levei meu sobrinho para almoçar lá e pude conversar por um momento com Marie France, proprietária e filha dos criadores do restaurante. Agradeci-lhe que continuasse à frente desse marco da vida paulistana. Nós, seus clientes, lhe somos gratos. Basta pensar no triste fim do "Bayswater Brasserie" em Sydney para saber que muitas vezes é mais fácil e tentador vender e deixar de ter problema.
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Depois do almoço fomos dar uma volta pelo centro da cidade. Fiquei gratamente surpreso. Estava tudo mais limpo, melhor conservado e com melhor cara do que pouco tempo atrás. Sem dúvida uma boa notícia e razão para ter esperança de que o centro possa ser recuperado. Torço para que seja assim. Gostar do centro é coisa de velhos paulistanos. É o que sou. Será que um dia será também a preferência dos jovens?
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Eu não sabia que ainda existia "A Voz do Brasil". Por alguma razão achava que o país já tinha se livrado dessa relíquia de ditaduras passadas. Mas outro dia, ouvindo rádio no carro, qual não foi a minha surpresa quando interromperam a programação para transmitir a malfadada "Voz do Brasil". Quais serão os poderosos lobbies corporativistas que impedem o bom senso de prevalecer? Por que não acabar de uma vez com essa porcaria? É incrível, mas às vezes o estatismo esquerdista dá a mão ao estatismo de extrema direita em casamentos inusitados. Quem paga a conta - e sofre - é o cidadão indefeso.
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A presidente Dilma, que por sinal não entende São Paulo, está de férias na Bahia. Quando voltar ao trabalho, em 9 de Janeiro, terá vários abacaxis pela frente. A crer nas projeções de analistas, o PIB de 2011 deve ficar abaixo de 3,0% e a inflação acima de 6,5%. Dois dados que resumem um mau primeiro ano de mandato. Nem remando muito vai ser fácil conseguir crescimento médio acima de 5,0% no seu governo, muito menos inflação controlada (para mim, 2,0% ao ano, 4,5% já é alto demais). Por enquanto a realidade está ganhando de 1 a 0. Seria melhor para o país se ela conseguisse empatar o jogo, mas me parece muito difícil sem um choque liberal. Choque liberal não tem a cara dela. Façam suas apostas e feliz ano novo!
quarta-feira, 28 de dezembro de 2011
quarta-feira, 7 de dezembro de 2011
ASAMG - Tenta de Novo
Ontem o IBGE publicou a (não) variação do PIB no terceiro trimestre. Segundo o instituto ficou no zero a zero, a economia nem cresceu nem encolheu. Um resultado conveniente demais. Pessoas desconfiadas como eu não acreditam nem em coincidências nem em números convenientes. Fazia quase dois meses que surgiam, de vez em quando, informações que indicavam que provavelmente a economia teria contraído entre Julho e Setembro. O número mais citado era queda de 0,3% no PIB. Se tivesse sido confirmado, teria sido uma chatice para o governo, principalmente porque a desaceleração continua no quarto trimestre e dois trimestres consecutivos de retração configuram uma recessão técnica. Com o resultado de ontem esse risco ficou adiado por ao menos três meses.
Não sei como é feito o cálculo do PIB, do ponto de vista prático. No entanto suponho que nas contas se tenha que fazer muitas hipóteses, devido à não disponibilidade de dados reais. Também deve haver projeções com margens maiores ou menores de erro. Por essa razão os resultados são revisados até dois anos depois de publicados. Não acontece só no Brasil, é assim por toda parte. No Brasil dos últimos anos, no entanto, o IBGE quando erra o faz de forma conveniente ao governo. Se para chegar ao resultado de ontem houve alguns elementos que foram estimados, pergunto aos meus botões se em algum momento alguém deu um jeitinho para ajustar o número final. O futuro dirá...
A evolução do PIB é um dado que dá muito que falar. Por isso mesmo do ponto de vista da propaganda, do governo ou da oposição, decimais a mais ou a menos, transformando um número de negativo em positivo ou vice-versa faz muita diferença. Para a economia, no entanto, esses decimais contam muito pouco. O que interessa é o quadro geral e a foto do quadro geral é muito triste: crescimento de 7,5% em 2010 (a ser confirmado) e estagnação no segundo semestre de 2011. Ninguém no governo Dilma vai nunca admitir, mas essa é a verdadeira herança maldita do governo anterior.
Lula pisou no acelerador do gasto público no seu último ano de governo. Certamente queria tanto deixar um bom sabor de boca, na sua despedida, como ajudar a eleger a sua candidata. Não há melhor cabo eleitoral do que uma economia bombando. Fazer a economia crescer na base do gasto público é uma mágica fácil, qualquer um sabe fazer. O duro é que um dia há que pagar a conta. Dilma, corretamente, tirou o pé do acelerador e a economia parou. Para maior azar, a conjuntura externa é desfavorável e deixou de dar a ajuda que deu em sete dos oito anos de governo Lula.
Mas esse não é o único cadáver no armário. A inflação deve fechar o ano beirando os 6,5% do limite da meta. Ajustar o dado da inflação é muito mais difícil. De novo vai haver a guerra dos decimais, como se uma inflação de 6,4% fosse aceitável e 6,6% fosse alta demais. A realidade é que inflação por volta de 6,5% já é alta demais, independentemente de estar dentro da meta ou não. Muito pior, é um número que evolui mais facilmente para cima do que para baixo. E nesse ponto o novo governo está fazendo uma aposta ainda mais arriscada, para não dizer irresponsável: abriu mão da política monetária e confia que o dragão da inflação vai abrandar graças a menos gasto público e à menor atividade econômica. Pode dar certo, mas o mais provável é que dê errado.
2012 é ano eleitoral. Dilma não tem nem a habilidade política do seu antecessor, muito menos a mesma capacidade de comunicação. A doença do ex-presidente tampouco veio ajudar o governo. É de se esperar que haja a tentação de voltar a aumentar o gasto público para reanimar uma economia que deve marcar passo no primeiro semestre. Seria a receita mais rápida para perder o controle da inflação. Para os tais desenvolvimentistas a opção é clara: mais vale crescer do que ter estabilidade de preços.
Eis um falso conflito. A escolha entre inflação e crescimento não é real, muito menos uma fatalidade. Há alternativas de maior alcance a longo prazo. Basta fazer as reformas estruturais que o Brasil tanto precisa e abandonar parte do besteirol desenvolvimentista. Dá pena ver que ninguém mais fala na reforma fiscal. Reforma previdenciária é vitupério. Privatizações, por enquanto nem as inevitáveis dos aeroportos de São Paulo, Campinas e Brasília. Comprometer-se com déficit público zero (depois de pagar os juros) ninguém nem cogita. Simplificar a vida das empresas e apoiar os empreendedores é papo de marciano.
Nesse aspecto o governo Dilma parece que vai ser perda de tempo, tal como o governo Lula o foi. É o pior lado dos governos do PT, mais daninho até do que a corrupção. Não reformam porque não enxergam nem a necessidade nem as vantagens. Pagam a conta todos os brasileiros, pelo tempo e oportunidades perdidos. Nenhum dos dois pode ser recuperado.
Não sei como é feito o cálculo do PIB, do ponto de vista prático. No entanto suponho que nas contas se tenha que fazer muitas hipóteses, devido à não disponibilidade de dados reais. Também deve haver projeções com margens maiores ou menores de erro. Por essa razão os resultados são revisados até dois anos depois de publicados. Não acontece só no Brasil, é assim por toda parte. No Brasil dos últimos anos, no entanto, o IBGE quando erra o faz de forma conveniente ao governo. Se para chegar ao resultado de ontem houve alguns elementos que foram estimados, pergunto aos meus botões se em algum momento alguém deu um jeitinho para ajustar o número final. O futuro dirá...
A evolução do PIB é um dado que dá muito que falar. Por isso mesmo do ponto de vista da propaganda, do governo ou da oposição, decimais a mais ou a menos, transformando um número de negativo em positivo ou vice-versa faz muita diferença. Para a economia, no entanto, esses decimais contam muito pouco. O que interessa é o quadro geral e a foto do quadro geral é muito triste: crescimento de 7,5% em 2010 (a ser confirmado) e estagnação no segundo semestre de 2011. Ninguém no governo Dilma vai nunca admitir, mas essa é a verdadeira herança maldita do governo anterior.
Lula pisou no acelerador do gasto público no seu último ano de governo. Certamente queria tanto deixar um bom sabor de boca, na sua despedida, como ajudar a eleger a sua candidata. Não há melhor cabo eleitoral do que uma economia bombando. Fazer a economia crescer na base do gasto público é uma mágica fácil, qualquer um sabe fazer. O duro é que um dia há que pagar a conta. Dilma, corretamente, tirou o pé do acelerador e a economia parou. Para maior azar, a conjuntura externa é desfavorável e deixou de dar a ajuda que deu em sete dos oito anos de governo Lula.
Mas esse não é o único cadáver no armário. A inflação deve fechar o ano beirando os 6,5% do limite da meta. Ajustar o dado da inflação é muito mais difícil. De novo vai haver a guerra dos decimais, como se uma inflação de 6,4% fosse aceitável e 6,6% fosse alta demais. A realidade é que inflação por volta de 6,5% já é alta demais, independentemente de estar dentro da meta ou não. Muito pior, é um número que evolui mais facilmente para cima do que para baixo. E nesse ponto o novo governo está fazendo uma aposta ainda mais arriscada, para não dizer irresponsável: abriu mão da política monetária e confia que o dragão da inflação vai abrandar graças a menos gasto público e à menor atividade econômica. Pode dar certo, mas o mais provável é que dê errado.
2012 é ano eleitoral. Dilma não tem nem a habilidade política do seu antecessor, muito menos a mesma capacidade de comunicação. A doença do ex-presidente tampouco veio ajudar o governo. É de se esperar que haja a tentação de voltar a aumentar o gasto público para reanimar uma economia que deve marcar passo no primeiro semestre. Seria a receita mais rápida para perder o controle da inflação. Para os tais desenvolvimentistas a opção é clara: mais vale crescer do que ter estabilidade de preços.
Eis um falso conflito. A escolha entre inflação e crescimento não é real, muito menos uma fatalidade. Há alternativas de maior alcance a longo prazo. Basta fazer as reformas estruturais que o Brasil tanto precisa e abandonar parte do besteirol desenvolvimentista. Dá pena ver que ninguém mais fala na reforma fiscal. Reforma previdenciária é vitupério. Privatizações, por enquanto nem as inevitáveis dos aeroportos de São Paulo, Campinas e Brasília. Comprometer-se com déficit público zero (depois de pagar os juros) ninguém nem cogita. Simplificar a vida das empresas e apoiar os empreendedores é papo de marciano.
Nesse aspecto o governo Dilma parece que vai ser perda de tempo, tal como o governo Lula o foi. É o pior lado dos governos do PT, mais daninho até do que a corrupção. Não reformam porque não enxergam nem a necessidade nem as vantagens. Pagam a conta todos os brasileiros, pelo tempo e oportunidades perdidos. Nenhum dos dois pode ser recuperado.
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