Nesta semana terminei de ler o "Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano", de Plinio Apuleyo, Carlos Alberto Montaner e Alvaro Vargas Llosa. No começo do ano tinha lido o segundo volume, "A Volta do Idiota". Durante muito tempo tentei comprar ambos livros na Espanha, sem sucesso. Ambos estão esgotados. Em Outubro do ano passado encontei por acaso um exemplar de "El Regreso del Idiota", em castelhano, na Livraria Cultura em São Paulo. Comprei, mas só pude começar a ler em Janeiro. Em Fevereiro, pouco antes de voltar para a Europa, encontrei o primeiro livro, na sua sexta edição brasileira, também na Livraria Cultura. Comprei e trouxe comigo na bagagem. Terminei de ler estes dias.
O segundo livro (El Regreso) é mais interessante e mais inteligente que o primeiro. Talvez porque seja mais atual e trate de temas e personagens que andam pululando pelo cenário político e econômico latino-americano. O primeiro livro tem algumas passagens brilhantes, como o primeiro capítulo, outras hilariantes, como os comentários sobre o livro de Eduardo Galeano "As Veias Abertas da América Latina", ou preocupantes, como a análise sobre a Teologia da Libertação. Mas também é muito mais panfletário e em alguns momentos exagera a dose de panfletarismo. Muitos de nós tivemos nossos momentos de idiotice em algum momento da vida ("quem não foi socialista com vinte anos não tem coração; quem continua sendo aos quarenta não tem cérebro" já disse alguém algum dia). Um ataque muito violento a antigas crenças às vezes acaba tendo o efeito oposto ao desejado: buscamos argumentos, por fracos que sejam, para justificar o injustificável.
Se tivesse que recomendar alguma passagem em especial para o leitor brasileiro sem tempo ou vontade de ler as quase 700 páginas de ambas obras, não hesitaria em apontar o prefácio da edição brasileira para o primeiro livro, escrito por Roberto Campos. Nele há um resumo super-condensado das principais idéias. O ex-diplomata e político brasileiro, conhecido na década de 70 como Bob Fields (a tradução do seu nome para o inglês), era detestado pela esquerda. Ele fez carreira durante a ditadura militar, a qual apoiou e para a qual trabalhou. No entanto, um passado autoritário nao impede ninguém de ser culto, inteligente ou antenado com o que está acontecendo no mundo. O ex-senador Roberto Campos teve o grande mérito de ter sido ferrenho opositor da perfeita idiotice que foi a Lei de Informática na década de oitenta, quando a maioria dos nossos intelectuais era a favor desta bobagem. E acerta no alvo ao identificar os "ismos" que explicam o atraso latino-americano: nacionalismo, populismo, estatismo, estruturalismo e protecionismo.
Aqueles com mais tempo não deveriam deixar de ler o primeiro capítulo, "Retrato de Família". Nele os autores descrevem com maestria quem é esse personagem, o perfeito idiota latino-americano. Em que bobagens acredita, quem são seus ídolos, as desculpas que dão para a triste história de meio-século de ditadura e fracassos econômicos em Cuba, seu anti-americanismo, seu marxismo de manual e um largo etc. É impossível ler este capítulo e não identificar nele a descrição de alguns políticos que andam pelaí. Mais triste é reconhecer amigos ou familiares que padecem desta doença infantilizadora, profundamente emocional, que é um certo esquerdismo com sabor de anos cinquenta. Acreditam tão piamente em certas bobagens que não são capazes de olhar ao redor e ver o quanto a realidade desmente, um dia depois do outro, seus chavões. Aliás, este é o aspecto mais surpreendente do elenco de "idéias" defendidas pelos perfeito-idiotas: são as mesmas desde a primeira metade do século passado! Será que não se dão conta de que o mundo mudou neste meio-tempo?
Por fim recomendo a leitura do capítulo III, "A Bíblia do Idiota", sobre o livro de Galeano. "As Veias Abertas da América Latina" é um best-seller não só no nosso continente, mas também na Europa. A quantidade de bobagens que expressa é quase surreal. Mais surreal ainda é que continue sendo lido e admirado por tanta gente. Um dos comentários que me chamou a atenção e trouxe um sorriso aos meus lábios foi ver que Galeano argumentava, em 1971, que a América Latina teria 650 milhões de habitantes no ano 2000. Bueno, estamos em 2008 e a estimativa mais corrente é a de que sejamos cerca de 450 milhões de latino-americanos. É só um detalhe, é óbvio, que demonstra como a esquerda costuma exagerar nas suas projeções demográficas. Grave mesmo é sua argumentação contra qualquer política demográfica, pois teria como objetivo matar no útero de suas mães os potenciais futuros guerrilheiros latino-americanos! Estas e outras alucinações seriam risíveis, se não fossem ditas e levadas a sério.
Não é nenhum segredo que não sou esquerdista. Portanto não pode ser nenhuma surpresa que não comungue com as teses da esquerda em geral, da socialista e comunista em particular. Mas o nó da questão é que não existe uma só esquerda. Na semana passada o governo espanhol, liderado pelo Partido Socialista, eliminou o imposto sobre fortunas. Este é um tipo de esquerda que respeito, pois ao menos tem a coragem de superar idéias que na prática demonstraram que não funcionam. O problema de boa parte da esquerda latino-americana, a brasileira incluída, é o caduquismo, a defesa de idéias esclerosadas e que a realidade já cansou de desmentir. Essa gente realmente parece não se dar conta de que o mundo mudou e continua mudando.
Tenho minha tese a respeito. Não é original, porque muita gente já a formulou antes. A ditadura militar brasileira, além dos muitos males que provocou, teve um efeito secundário devastador: a perda de uma geração. Tanto no plano cultural como político, é normal que uma geração suplante a outra, em geral por oposição. Meus contemporâneos, gente que agora tem entre quarenta e cinquenta anos, viveu sua juventude em meio ao final da ditadura. Houve a anistia, o retorno dos exilados, a publicação de livros proibidos, a criação de novos partidos. Haviam passado quase vinte anos desde o golpe militar, mas do ponto de vista das idéias os que voltaram do exílio trouxeram consigo os velhos slogans da década de sessenta. O inimigo claro para minha geração era a ditadura, portanto naqueles tempos muitos de nós embarcamos sem nenhum espírito crítico nesta volta ao passado e adotamos de coração toda a parafernália intelectual da geração anterior. Em outras palavras, não houve conflito de gerações, não matamos pai e mãe. Isso explica como é possível que os velhos chavões dos anos cinquenta possam ter perdurado por tanto tempo.
Nós, os atuais quarentões, deveríamos ser os líderes culturais e políticos do Brasil atual. A triste verdade é que não somos. Não soubemos criar idéias novas. Quer absurdo maior que considerar o governador de São Paulo, José Serra, um setentão desta geração de exilados, como melhor candidato para suceder Lula? Ou que um Caetano Veloso ainda seja um referente cultural, quando é um avô? Minha geração precisa urgentemente encontrar seus próprios valores e matar de uma vez pai e mãe, inclusive porque atrás vêm os jovens de vinte e poucos anos e nós temos a obrigação de dar a eles idéias que possam combater e à sua vez possam matar a nós, seus pais e suas mães. Só assim o mundo evolui. Poderíamos começar enterrando de uma vez por todas o vasto repertório de bobagens dos perfeitos idiotas latino-americanos. Seria um excelente ponto de partida!
domingo, 22 de junho de 2008
domingo, 15 de junho de 2008
ASAMG - Quando o atraso e a liberação de verbas prevalecem
O bom senso por enquanto não prevaleceu. O velho truque de liberar verbas do orçamento para deputados da base aliada fez o resto. O Governo teve, nesta semana, uma primeira vitória na recriação do imposto do cheque. Esperemos que seja uma vitória de Pirro: "Mais uma vitória como esta, e estou perdido" é o que teria dito o general grego depois de vencer a batalha de Ásculo com enormes baixas. O fato da CSS ter sido aprovada na Câmara fará aumentar o debate, não só sobre este impostinho em concreto, mas sobre o sistema tributário em geral. A oposição está se posicionando contra a criação de novos tributos e empurrando o Governo e seus aliados para o incômodo papel de tributadores. PT, partido do tributo é um slogan que pode pegar, principalmente em ano de eleição.
Chega a ser incompreensível que o PT e o Governo estejam dispostos a entrar numa luta tão inglória como esta. A CSS é um impostinho - 10 bilhões de arrecadação é muito dinheiro, mas não é tanto assim. Seria cerca de 1,5% da arrrecadação federal deste ano. Ele tem as desvantagens da CPMF e não tem as suas qualidades: simplicidade e transparência. A demagogia de deixar isentos determinados setores da população vai tornar a arrecadação muito mais complicada e vai abrir uma enorme porta por onde passará a sonegação. Neste ano há récord de arrecadação e é realmente difícil vender a idéia de que não há dinheiro para a saúde. O que não há é competência administrativa no Governo Federal. Se tudo isto não bastasse, tem muito especialista dizendo que a CSS é inconstitucional, ou seja, há o risco de que se ela for aprovada e sancionada pelo presidente, no final acabe derrubada pelo STF.
Nós cidadãos e contribuintes o que deveríamos estar dizendo a nossos governantes, de qualquer nível de governo e qualquer partido, é que façam mais com menos dinheiro. Isso é ser bom administrador. Realizar mais gastando mais é algo que qualquer idiota sabe fazer. Não é preciso ser especialmente competente. O difícil é conseguir melhores resultados com os mesmos recursos - aliás, esta é a razão pela qual alguns executivos são muito bem pagos: eles conseguem resultados que outros não alcançam.
O debate está cada vez mais presente e é um divisor de águas: qual deve ser o tamanho da arrecadação fiscal? Para a vanguarda do atraso, os que pensam como se ainda estivéssemos na primeira metade do século passado, quanto mais melhor. O Estado provedor é quem deve resolver os problemas da sociedade, portanto não há limite para a tributação. Outros, entre os quais me incluo, vêm que a tributação no Brasil é extremamente alta, faz muito tempo que estamos acima de 40% do PIB. Portanto a conclusão lógica seria não aceitar nenhum imposto a mais. Não se trata apenas de querer pagar menos impostos e ao mesmo tempo exigir que os govenantes de turno façam mais com o que é arrecadado. Em outras palavras, não é só exigir mais eficiência dos governantes. Há também uma convicção que a partir de determinado ponto não adianta tributar mais porque a arrecadação não vai aumentar, só a sonegação. É muito provável que o Brasil já esteja nesta situação e não seria nenhuma surpresa se com menos impostos e menos alíquotas a arrecadação subisse a médio prazo.
O DEM parece ter percebido o filão e ataca com raiva. Talvez dessa maneira acabem exorcizando os pecados do seu passado e no futuro se tornem uma alternativa decente na qual votar. Minhas convicções democráticas me fazem torcer o nariz para um partido cuja origem é a Arena, o partido da ditadura militar. Mas que partido hoje em dia é um bom porto para os que defendem o liberalismo econômico? O PSDB poderia desempenhar este papel, mas precisaria perder a vergonha de defender suas idéias. Os tucanos estão contra a recriação do imposto do cheque. É um bom começo. Poderiam liderar o debate sobre a reforma tributária. A proposta do Governo não é ruim, mas é tímida e vai muito devagar. Seria preciso ser muito mais agressivo para desmontar tanto quanto possível o monstrengo criado pela Constituição de 88.
É difícil pensar em melhor oportunidade nos últimos 20 anos, tanto do ponto de vista político como econômico, para empreender a reforma fiscal. Se a guerra a favor e contra a CSS acabar desembocando num amplo debate sobre a reforma fiscal, todos sairemos ganhando. E se o bom senso e a ousadia prevalecerem, poderíamos até conseguir um milagre: menos impostos, como querem os liberais, e o mesmo nível de arrecadação que temos hoje em dia. A diferença estaria na maior eficiência econômica dos tributos, na menor sonegação e maior crescimento econômico.
Dá para ser otimista? Ou será que perderemos também esta grande oportunidade? Às vezes chego a acreditar que há razão para ter esperanças. Outro dia li na coluna do Kennedy Alencar, na Folha online, que o economista Luiz Gonzaga Belluzzo teria recomendado ao presidente Lula elevar o superávit das contas públicas a 5% do PIB. Não consigo me lembrar de nenhuma recomendação de política econômica feita pelo Belluzzo que tenha sido tão sensata e oportuna como esta. Quem te viu e quem te ve! O que me lembro bem é do monte de asneiras que os economistas heterodoxos, cepalinos, muitos deles da Unicamp ou da UFRJ propunham. Se eles foram capazes de criar e implantar uma megapicaretagem como o Plano Cruzado! É admirável que agora um dos mentores daquela patota proponha algo tão sensato! Deveria ser uma razão para pensar que talvez esteja caindo a ficha e que ainda haja esperanças de desmentir DeGaulle e que um dia o Brasil seja finalmente um país sério. Dá para fazer, mas não é compatível com cocorocadas como a CSS!
Chega a ser incompreensível que o PT e o Governo estejam dispostos a entrar numa luta tão inglória como esta. A CSS é um impostinho - 10 bilhões de arrecadação é muito dinheiro, mas não é tanto assim. Seria cerca de 1,5% da arrrecadação federal deste ano. Ele tem as desvantagens da CPMF e não tem as suas qualidades: simplicidade e transparência. A demagogia de deixar isentos determinados setores da população vai tornar a arrecadação muito mais complicada e vai abrir uma enorme porta por onde passará a sonegação. Neste ano há récord de arrecadação e é realmente difícil vender a idéia de que não há dinheiro para a saúde. O que não há é competência administrativa no Governo Federal. Se tudo isto não bastasse, tem muito especialista dizendo que a CSS é inconstitucional, ou seja, há o risco de que se ela for aprovada e sancionada pelo presidente, no final acabe derrubada pelo STF.
Nós cidadãos e contribuintes o que deveríamos estar dizendo a nossos governantes, de qualquer nível de governo e qualquer partido, é que façam mais com menos dinheiro. Isso é ser bom administrador. Realizar mais gastando mais é algo que qualquer idiota sabe fazer. Não é preciso ser especialmente competente. O difícil é conseguir melhores resultados com os mesmos recursos - aliás, esta é a razão pela qual alguns executivos são muito bem pagos: eles conseguem resultados que outros não alcançam.
O debate está cada vez mais presente e é um divisor de águas: qual deve ser o tamanho da arrecadação fiscal? Para a vanguarda do atraso, os que pensam como se ainda estivéssemos na primeira metade do século passado, quanto mais melhor. O Estado provedor é quem deve resolver os problemas da sociedade, portanto não há limite para a tributação. Outros, entre os quais me incluo, vêm que a tributação no Brasil é extremamente alta, faz muito tempo que estamos acima de 40% do PIB. Portanto a conclusão lógica seria não aceitar nenhum imposto a mais. Não se trata apenas de querer pagar menos impostos e ao mesmo tempo exigir que os govenantes de turno façam mais com o que é arrecadado. Em outras palavras, não é só exigir mais eficiência dos governantes. Há também uma convicção que a partir de determinado ponto não adianta tributar mais porque a arrecadação não vai aumentar, só a sonegação. É muito provável que o Brasil já esteja nesta situação e não seria nenhuma surpresa se com menos impostos e menos alíquotas a arrecadação subisse a médio prazo.
O DEM parece ter percebido o filão e ataca com raiva. Talvez dessa maneira acabem exorcizando os pecados do seu passado e no futuro se tornem uma alternativa decente na qual votar. Minhas convicções democráticas me fazem torcer o nariz para um partido cuja origem é a Arena, o partido da ditadura militar. Mas que partido hoje em dia é um bom porto para os que defendem o liberalismo econômico? O PSDB poderia desempenhar este papel, mas precisaria perder a vergonha de defender suas idéias. Os tucanos estão contra a recriação do imposto do cheque. É um bom começo. Poderiam liderar o debate sobre a reforma tributária. A proposta do Governo não é ruim, mas é tímida e vai muito devagar. Seria preciso ser muito mais agressivo para desmontar tanto quanto possível o monstrengo criado pela Constituição de 88.
É difícil pensar em melhor oportunidade nos últimos 20 anos, tanto do ponto de vista político como econômico, para empreender a reforma fiscal. Se a guerra a favor e contra a CSS acabar desembocando num amplo debate sobre a reforma fiscal, todos sairemos ganhando. E se o bom senso e a ousadia prevalecerem, poderíamos até conseguir um milagre: menos impostos, como querem os liberais, e o mesmo nível de arrecadação que temos hoje em dia. A diferença estaria na maior eficiência econômica dos tributos, na menor sonegação e maior crescimento econômico.
Dá para ser otimista? Ou será que perderemos também esta grande oportunidade? Às vezes chego a acreditar que há razão para ter esperanças. Outro dia li na coluna do Kennedy Alencar, na Folha online, que o economista Luiz Gonzaga Belluzzo teria recomendado ao presidente Lula elevar o superávit das contas públicas a 5% do PIB. Não consigo me lembrar de nenhuma recomendação de política econômica feita pelo Belluzzo que tenha sido tão sensata e oportuna como esta. Quem te viu e quem te ve! O que me lembro bem é do monte de asneiras que os economistas heterodoxos, cepalinos, muitos deles da Unicamp ou da UFRJ propunham. Se eles foram capazes de criar e implantar uma megapicaretagem como o Plano Cruzado! É admirável que agora um dos mentores daquela patota proponha algo tão sensato! Deveria ser uma razão para pensar que talvez esteja caindo a ficha e que ainda haja esperanças de desmentir DeGaulle e que um dia o Brasil seja finalmente um país sério. Dá para fazer, mas não é compatível com cocorocadas como a CSS!
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