Estou a trabalho em Portugal. Ontem fui almoçar num restaurante da cidadezinha onde está a empresa do meu cliente. Havia uma televisão ligada no telejornal. Uma das matérias de destaque era sobre a reação, no Brasil e no mundo, das palavras do presidente Lula, ao comparar os presos políticos cubanos com os criminosos comuns presos em São Paulo. A matéria era longa, mostrava diversas cenas da sua recente visita a Cuba e a série de declarações desastrosas sobre a situação política na ilha dos irmãos Castro.
Esta viagem fez um dano enorme à imagem do Lula. Eu me pergunto, no entanto, qual é a novidade? Surpreende alguém a dupla moral da esquerda, sempre tão rápida em denunciar governos ou regimes de direita, e sempre tão leniente com as maldades dos seus aliados? É algo novo que gente de bem defenda o indefensável quando se trata de Cuba? Só agora estamos nos dando conta de que em matéria de política externa o nosso presidente está pessimamente assessorado e que durante os seus dois mandatos a nossa diplomacia deu um vexame atrás do outro, colecionando uma larga lista de derrotas e asneiras? Para mim o inusitado é que não haja ninguém no governo com bom senso para aconselhá-lo a virar a página e deixar de tentar se explicar no caso de Cuba.
Por coincidência, ontem o IBGE divulgou o resultado do PIB brasileiro no último trimestre do ano passado e a sua variação em 2009. Mais uma vez vêm à mente as muitas besteiras ditas pelo presidente e alguns dos seus ministros sobre o impacto da crise financeira no Brasil (crise americana não vai cruzar o Atlântico e chegar ao Brasil, marolinha, gripinha, etc). Até Setembro de 2008 esperava-se um crescimento superior a 5% da economia em 2009; ficou em -0,2%. O impacto da crise foi, portanto, de mais de 5 pontos percentuais. Isso é ser severamente atingido. No entanto as declarações governamentais primeiro foram de que o país estava imune à recessão. Quando não dava mais para esconder que não seria assim, a mensagem oficial passou a ser de que no Brasil a crise seria do tipo leve. Não foi, sendo que a verborragia e prepotência governamental de nada serviram para modificar o rumo dos acontecimentos.
Se tem uma coisa da qual não vai dar para sentir falta, é da incontinência verbal do nosso futuro ex-presidente. Durante muito tempo fiquei chocado com as bobagens ditas por Lula. Até acredito que algumas delas sejam genuínas, como quando disse que sua mãe tinha nascido analfabeta, ou mais recentemente os mega-absurdos sobre os gases de efeito estufa gerados no hemisfério norte (ver YouTube "Lula mundo redondo"). Essa intervenção já começa com uma pérola: "Eu já disse várias vezes: Freud dizia que tinha algumas coisas que a humanidade não controlaria. Uma delas eram as intempéries"(sic).
Às vezes o Lula me lembra o finado e nada saudoso presidente Figueiredo, o último ditador militar. Figueiredo dizia o que pensava, sem antes pensar muito. Quase trinta anos depois gente da minha geração ainda se lembra de bobagens ditas por ele, como de que preferia cheiro de cavalo a cheiro do povo. O finado e sim saudoso colunista da Folha de São Paulo, Flávio Rangel, chamava a língua solta do então presidente de "interessante estilo deixa que eu chuto". O que Flávio Rangel diria das declarações do presidente Lula?
Lula diz tanta coisa errada, que faz tempo que mudei de opinião: creio que o presidente não é nem tão ignorante quanto possa parecer, nem tão mal informado. Ele simplesmente diz o que agrada a maioria do seu eleitorado. Querem um exemplo? Quando em 2008 empresas brasileiras perderam bilhões de reais com derivados cambiais, o presidente as criticou por terem perdido dinheiro especulando contra o real. Ora, essas empresas perderam dinheiro especulando a favor do real. Como não dava para criticar quem tinha apostado a favor da moeda brasileira, o presidente deu a entender que a coisa era ao contrário, criticou os especuladores e ficou bem com seu público cativo. Na época pouquíssima gente notou que a realidade era o oposto do que o presidente dissera, e ele não desperdiçou a oportunidade de fazer demagogia.
Será que quando o também finado e saudoso Sérgio Porto escreveu o "Febeapá", ele imaginou a que ponto o besteirol faria parte da nossa vida? As tolices inócuas dos nossos representantes às vezes causam riso, outras estupor, mas acabam entrando para o folclore político, por inofensivas. Graves são as bobagens com coisa séria, porque afetam diretamente a vida de pessoas de carne e osso. É o caso das sucessivas declarações de Lula sobre Cuba. Dá vontade de parodiar o Rei Juan Carlos I da Espanha, em momento de tanta inspiração, e gritar em alto e bom som, para talvez o presidente ouvir: ¿Por qué no te callas?
sexta-feira, 12 de março de 2010
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