Estava em Barcelona no dia três, quando houve o primeiro turno das eleições no Brasil. Aqui na Europa a imprensa dava como certa a vitória de Dilma Rousseff. A maneira como era feita a cobertura levava a que meus conhecidos me considerassem um lunático, ao insistir tanto que haveria um segundo turno, que a vitória da ex-ministra não eram favas contadas. Tanto em Portugal como aqui na Espanha Lula e a sua candidata eram considerados imbatíveis. Bueno, parece que os eleitores brasileiros eram de outra opinião.
Dilma Rousseff ganhou o primeiro turno, mas não no primeiro turno. O PT, a começar pelo presidente da República, fez tanto finca pé em que ela teria maioria absoluta e houve tanto oba-oba e "já ganhou", que sua vitória teve o sabor amargo de derrota. As cenas que vi na televisão espanhola mostravam petistas e aliados com indisfarçável cara de bunda mal lavada. Já Serra dizia estar feliz e via-se que estava mesmo. Depois de insistir tanto nessa bobagem de ganhar no primeiro turno, não só Lula tem que engolir essa derrota para a sua vaidade mega-inflada, como tem que admitir que até hoje só o seu desafeto Fernando Henrique Cardoso conseguiu se eleger assim, por sinal duas vezes e em ambas ocasiões derrotando o próprio Lula.
Mas se todo mundo achava que Lula ia eleger sua candidata, o que foi que aconteceu? O que saiu errado? Para usar uma construção cara ao presidente, nunca antes na história desse país tinha sido criada uma estrutura tão forte, uma máquina eleitoral tão poderosa como a que funcionou para a candidata petista. O PT não só se coligou com o mais poderoso partido brasileiro, PMDB, como fez todos os acordos regionais que pôde para viabilizar sua vitória. O caso mais notório foi sacrificar a candidatura própria ao governo de Minas. As doações para a campanha de Dilma deixaram Marina e Serra muito atrás. O próprio presidente fez mais campanha para a sua candidata do que para si próprio em 2006. Nem assim foi suficiente.
Provavelmente parte do problema de Dilma é que sua candidatura é totalmente artificial. Foi escolha pessoal e unilateral de Lula, imposta ao seu partido. Se o presidente não tivesse feito assim, alguém teria tido a idéia de lançá-la candidata à presidência? Provavelmente não, e por razões óbvias. Essas razões óbvias foram insistentemente esquecidas durante os dois últimos anos, baseadas na idéia de que a popularidade de Lula resolveria tudo. Muita gente acreditou nessa balela. Mas Dilma não é uma política profissional. Não tinha nenhuma experiência eleitoral. Não é carismática. Até bem pouco tempo nem sequer era conhecida. Pedir para votar nela é como dizer para um jovem que deve aceitar um casamento arranjado pelos seus pais: pode ser uma escolha que dê certo (amigos indianos se casaram dessa forma e são muito felizes), mas o risco é enorme. E muita gente adulta prefere pensar por si própria e fazer o que acha mais adequado, e não o que os pais dizem para fazer.
A segunda parte dessa equação é que José Serra é um político conhecido, experiente e experimentado. Tem trânsito, cancha eleitoral, é conhecido nacionalmente há muito tempo, foi bem avaliado como prefeito de São Paulo e como governador. E mais importante que qualquer outra coisa: desde o final do ano passado aliados e opositores o criticam pela maneira como administra sua candidatura, mas insistentemente os fatos demonstram que ele não pode estar tão errado, pois a sua resiliência é enorme. Depois de ter sido considerado acabado tantas vezes, ele conseguiu não só chegar ao segundo turno, como o momentum lhe é favorável. Tudo que a candidatura de Dilma tem de artificial a de Serra tem de substancial, independentemente das preferências políticas do eleitor.
O segundo turno, em 31 de Outubro, é uma nova eleição. Não será de maneira nenhuma um passeio, um mero trâmite burocrático para eleger Dilma. O PT já não contará com vantagem no tempo de TV. Nos cinco maiores estados as eleições para governador foram resolvidas no domingo passado e muitas análises mostram que isso pode se tornar uma grande vantagem para os tucanos. Minas Gerais provavelmente será um estado decisivo na votação. Depois do enorme sapo que os petistas mineiros tiveram que engolir, a derrota de Hélio Costa não ajuda em nada a levantar os ânimos. E se tudo isso não fosse suficiente, ouço dizer nos bastidores que Dilma está esgotada fisicamente. Sabe-se lá como ela chegará ao final da campanha.
Se nos últimos meses mais de uma vez disse que achava que Serra era o favorito, agora estou mais do que convencido disso. Não quer dizer de maneira nenhuma que ele vá ganhar a eleição. A poderosa máquina eleitoral montada pelo presidente Lula continuará trabalhando para Dilma. Mas depois do último domingo, ele ficou um pouco mais perto do Planalto, e ela um pouco mais longe.
Termino este post expressando minha felicidade de que Mário Vargas Llosa tenha ganhado o premio Nobel de literatura. Vargas Llosa é um excelente escritor e um brilhante intelectual. É um feroz defensor da liberdade humana e da sociedade aberta. A América Latina e o mundo seriam lugares muito melhores se houvesse mais gente como ele!
quinta-feira, 7 de outubro de 2010
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3 comentários:
T'imaginaves el que ha acabat passant quan et vaig preguntar per la Dilma el juny al restaurant Els Pescadors de Barcelona?
Joaquim
Joaquim,
En Junio yo creía que habría una segunda vuelta, pero en Agosto, durante mí viaje a Brasil, tuve la sensación de que Dilma ganaría ya el día 03/10. Solo a mitad de Septiembre volví a tener esperanza en una segunda vuelta y si quieres mi opinión, hoy pienso que hay una probabilidad medio-alta de que Serra gane.
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