Estou em Uppsala, na Suécia, onde cheguei há cinco semanas. Não é a primeira vez que passo férias de verão na Escandinávia. Desde 1988 venho regularmente. Entre 1988 e 1997 vim quase todos os anos por pelo menos parte das minhas férias. Ao mudar-me para a Espanha em 1998 passei a vir principalmente a trabalho. Fazia dez anos que não passava uma longa temporada por aqui. Nestas cinco semanas pude constatar que muitas coisas mudaram ao longo destes anos.
Na minha primeira visita a Estocolmo cheguei em pleno midsommar dag (dia do meio do verão, sempre um sábado). Midsommar é comemorado no fim-de-semana mais próximo ao solstício de verão, normalmente o último fim-de-semana de Juho. As pessoas trabalham na sexta-feira até a hora do almoço, depois vão para o campo ou para algum parque, montam um poste decorado de flores e entre a família e os amigos dançam em volta deste poste. As festas se prolongam noite a dentro - midsommar afton ou noite do meio de verão. Dependendo de onde se esteja na Suécia, nesta época do ano praticamente não há noite - ao menos no horizonte há sempre luz do dia. Mais ao norte há lugares onde o sol não se põe.
A festa de midsommar é a mais importante na Suécia depois do Natal. Algumas pessoas argumentam que é inclusive mais importante que o Natal, pois todos celebram o verão, mas nem todos são cristãos, portanto nem todo mundo vê um significado especial nos dias 24 e 25 de Dezembro. Quando cheguei a Estocolmo no midsommar de 1989 a cidade estava praticamente vazia. Mais impressionante, não havia nenhuma loja aberta. Ninguém trabalhava naquele fim-de.semana. Até para encontrar um lugar para comer era difícil. As duas únicas alternativas eram a estação de trem ou o aeroporto de Arlanda.
Desta vez o horário de funcionamento das lojas foi o primeiro que me surpreendeu ao chegar a Uppsala, num domingo. O supermercado ao lado do apartamento onde estou hospedado estava aberto. Agora os supermercados podem abrir todos os dias, inclusive aos domingos, de 08:00 a 23:00. Um horário muito mais flexível do que em Barcelona por exemplo. Há vinte anos seria impensável. Mais inacreditável foi constatar que os supermercados abriram também nos três dias do midsommar, ainda que com horário restrito. A maioria dos restaurantes na cidade também estavam abertos. Uma revolução em comparação com a Suécia do passado.
Outra mudança surpreendente, a pesar de não ser visível para turistas, está no sistema de ensino. Faz alguns anos foram criadas escolas privadas, mantidas com dinheiro público. Particulares que queiram criar uma escola podem fazê-lo. O Estado paga por cada aluno matriculado. A quantia é compatível com o que custa manter um aluno na rede pública e também suficiente para que as escolas possam dar um pequeno lucro. A novidade se extende cada vez mais e atualmente 10% dos alunos estudam em escolas privadas, uma revolução no país da social-democracia. Perguntei a vários amigos o que pensam sobre o assunto. Os mais velhos são mais céticos e às vezes críticos. Sua preocupação é que se introduza diferenças entre a educação recebida pelas crianças dependendo de onde estudem. Também os preocupa o resultado a longo prazo. Mas quando argumento que os pais sempre têm a possibilidade de decidir a que escola mandar seus filhos e que os resultados dos exames dos alunos das escolas privadas são acima da média, eles reconhecem que ambos aspectos são verdadeiros.
Poderia continuar com uma longa lista de como a sociedade sueca atual é diferente da dos anos setenta. Estou fazendo um curso. Minha professora contou outro dia que naquela época os livros de "Pipi meias-longas" eram considerados capitalistas e portanto inapropriados para crianças. Ela lia para seus filhos o livro do "Camarada Jesus", um personagem estilizado sobre a figural de Che Guevara. A invasão do Estado na vida das pessoas, os altos impostos e uma desesperada busca da igualdade eram outro aspecto da sociedade sueca daqueles tempos. Hoje muitas coisas mudaram e certos conceitos são deixados para tras. Até a convenção de tratar todo mundo de "você" (du), com a única exceção do Rei e da Rainha, uma marca do igualitarismo sueco desde os anos 60, está mudando. Cada vez mais em lojas e restaurantes os clientes são tratados de senhor ou senhora (ni), uma tendência que choca os mais velhos, que viveram com entusiasmo a revolução do "du" (você).
Nestas cinco semanas na Escandinávia vou constatando o quanto esta sociedade é dinâmica e se adapta aos novos tempos. As vezes é preciso repensar certos conceitos ou superar certos tabus e idéias ultrapassadas. Não é fácil, mas está acontecendo. Quando vejo todas estas mudanças não posso deixar de comparar com o Brasil e com o difícil que é adotar idéias novas no nosso país. A patrulha ideológica continua viva e atuante. Os chavões dos anos 50 se resistem a morrer e dar passagem a idéias mais conformes com os tempos em que vivemos. É uma pena!
Da Suécia para a Colômbia. Não queria terminar este post sem mencionar a alegria que senti com a notícia da libertação de Ingrid Betancourt e outros 14 reféns que estavam nas mãos dos narco-guerrilheiros das FARCs. Alegro-me pelas pessoas que recuperaram sua liberdade e pelo tremendo golpe que representou contra o grupo esquerdista. O fim deste pesadelo parece estar cada dia mais próximo e isso é ótima notícia, não só para a Colômbia, mas para toda América Latina.
O detalhe patético foi a nota do Fidel Castro, dizendo ser contra o sequestro político praticado pelas FARC. Agora que é carta fora do baralho, está doente e próximo do final é muito fácil para Fidel fazer este tipo de declaração. Porque não condenou estes sequestros anos atrás, quando ocorreram? Mais importante, porque não defende a liberdade dos presos políticos que estão nas prisões cubanas, para onde ele mesmo os mandou? Oportunismo político pode ser realmente desprezível! Mas o que mais poderíamos esperar de alguém como Fidel Castro?
quinta-feira, 10 de julho de 2008
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