Meus pais se mudaram para as proximidades do aeroporto de Congonhas em 1970. Vivem na mesma casa até hoje. Eu morei durante vinte anos lá, portanto cresci ao lado do aeroporto. Na minha infância não houve rua do bairro que eu não percorresse com a minha bicicleta. Tenho inclusive idade para lembrar-me da construção de cada grande obra de infra-estrutura na região: avenidas Vicente Rao e Águas Espraiadas, obras de saneamento (água e esgoto), asfaltamento das ruas, iluminação, o metrô chegando a São Judas, Conceição e Jabaquara, cada ampliação do prédio do aeroporto e um largo etc.
Quando nós nos mudamos para a nossa rua éramos dos primeiros moradores. Meu pai brincava com os amigos que tinha comprado uma casa de campo. No bairros do Campo Belo e Brooklin só havia casas, quase nenhum prédio. Mesmo assim, quatro décadas atrás a cidade já tinha chegado até o aeroporto. Minha bisavó e minha avó moravam em casas perto de onde hoje é o Shopping Ibirapuera (se não me falha a memória o shopping só foi construído por volta de 1976). Já naquela época elas estavam na rota de pouso dos aviões e havia dias em que o barulho das turbinas era bastante incômodo.
Em 1970 a cidade de São Paulo tinha 5,9 milhões de habitantes. Hoje são 10,9. Esses cinco milhões a mais foram viver por todas partes, inclusive na zona sul, ao lado de Congonhas. Não adianta dizer que o aeroporto foi construído no início do século passado, quando o local era um lugar ermo e que foi a cidade que o abraçou - isso agora é história. Se podia ou não ter sido evitado, não faz mais diferença, porque já aconteceu. O aeroporto de Congonhas está agora no meio da cidade e seu funcionamento é um problema cada vez maior, principalmente por questões de segurança.
Recentemente houve um novo acidente: um aviãozinho teve que abortar uma decolagem e quase acaba na avenida. As pistas são muito curtas e sem nenhuma margem nas cabeceiras. Um acidente tem tudo para virar uma catástrofe, como foi o caso no ano passado com o avião da TAM. Deveria ser uma coisa óbvia estar pensando em quando fechá-lo. No entanto, nos últimos anos foram feitos investimentos para aumentar o número de vôos e passageiros. Faz tempo que ouço a reclamação de amigos de outros estados, sobretudo do Rio de Janeiro, queixando-se que não haja vôo nacional que não passe por Congonhas. Os investimentos serviram para que o aeroporto virasse um mini hub nacional. Pode ser economicamente viável a curto prazo, mas na prática é um grande absurdo.
Devíamos para de pensar que um país do tamanho do Brasil tem que concentrar todos seus vôos em uma ou duas cidades. Pior ainda se estas são as duas mais populosas do país. O maior aeroporto da Alemanha está em Frankfurt, uma cidade de 700 mil habitantes e apenas. É também um dos maiores aeroportos da Europa e do mundo. É um exemplo claro que o hub nacional não tem que necessariamente ser na maior cidade. O desenvolvimento dos aeroportos europeus também demonstra que um mesmo país pode ter mais de um hub.
A notícia de que o Governo pensa num novo aeroporto para a cidade de São Paulo é uma grande notícia. Que seja construído pela iniciativa privada, é melhor ainda. Que esteja pensando em privatizar o Galeão e Viracopos quase nem dá para acreditar. Depois de marcar passo durante seis anos, parece que este Governo está acordando para as vantagens de deixar a iniciativa privada operar determinados serviços, em alguns casos privatizando-os. A boa notícia mesmo seria se houvesse um plano para descentralizar o tráfico aéreo no país, sem que São Paulo ou Rio sejam necessariamente o centro da malha.
Pensando no que já vi em outros países e ressalvando que minha opinião é puro achismo, sem estar baseada em dados, me atreveria a dizer que Congonhas é uma exceção: aeroportos no meio de grandes cidades são cada vez mais raros e têm os dias contados (Berlin vai fechar os dois aeroportos que estão no perímetro urbano, Hong Kong fechou o antigo aeroporto, para citar apenas alguns exemplos). Ter um aeroporto pertinho pode ser uma comodidade para quem viaja, mas se os meios de transporte, coletivos e privados, forem eficientes não é um grande problema que os aeroportos estejam distantes do centro - aliás, esta é a regra na maior parte do mundo. Dentro de um plano de descentralização, parece-me perfeitamente natural imaginar que além de Guarulhos e do novo aeroporto, possivelmente em Sorocaba, também haja um aeroporto no Vale do Paraíba, entre Taubaté e São José dos Campos e conectado ao trem de alta velocidade de São Paulo ao Rio. O Nordeste poderia perfeitamente ter um ou dois hubs de vôos intercontinentais. Campinas com Viracopos e outras cidades do interior do estado de São Paulo poderiam ter importantes aeroportos, descentralizando ainda mais o transporte aéreo.
Na campanha à prefeitura de São Paulo sinto falta de que algum dos candidatos esteja defendendo abertamente o fechamento de Congonhas a curto prazo (no máximo logo depois da Copa do Mundo de 2014). A área que ocupa permitiria uma intervenção urbana de grandes dimensões na cidade. Mudaria a cara da zona sul e de São Paulo. Muitas coisas poderiam ser feitas e, tendo claro o objetivo final e a data, o próximo prefeito já poderia estar fazendo obras que levassem à execução desse plano. Muitos candidatos querem se posicionar para no futuro concorrerem ao Governo do Estado ou à Presidência. O melhor seria começar a pensar grande e inovar. A cidade agradeceria.
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
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