sexta-feira, 17 de outubro de 2008

ASAMG - O Lento Ocaso de uma Era

A disputa no segundo turno das eleições municipais em São Paulo está sendo extremamente interessante. Muitos consideram o que acontece por aqui como uma antecipação do confronto nacional de 2010. Há análises para todos os gostos sobre que candidatos saem melhor colocados se ganhar o atual prefeito ou a ex-prefeita. No entanto não vi nem li nada sobre o que me parece a maior novidade: o ocaso de uma geração de políticos e de determinadas idéias sobre o melhor modelo de sociedade.

Como Gilberto Kassab ganhou o primeiro turno e saiu na frente nas pesquisas de intenção de voto, sua campanha no segundo turno é muito comportada. Está evitando o confronto, uma aposta bastante razoável para quem apenas precisa não errar. A situação de Marta Suplicy é muito mais complicada, pois tem que virar o jogo. Sua aposta é a do confronto. Para quem joga roleta, é como pôr todas as fichas numa única cor - no caso dela o vermelho. Se der certo, ganha tudo, se der errado, a perda é desastrosa.

Parece que está sendo um tiro no pé. A tentativa de fazer insinuações sobre a vida pessoal do atual prefeito deu completamente errado. A Justiça Eleitoral concedeu a Kassab vários minutos de direito de resposta, numa condenação formal da propaganda da candidata petista. Mas este é talvez o mal menor. Tentar ganhar votos (ou fazer o adversário perdê-los) apelando para o preconceito contra homossexuais foi não só vergonhoso, como causou uma indignação generalizada. A coisa era tão grosseira que até alguns membros do PT criticaram a estratégia de Marta Suplicy. É surpreendente que sua campanha tenha enveredado por este caminho, pois esta mancha no seu currículo será lembrada enquanto ela estiver na política. Depois do escândalo do mensalão o PT já não pode mais se apresentar como o partido dos anjos incorruptíveis. Agora arrisca-se a perder até a possibilidade de apresentar-se como um partido ético, progressista em questões sociais. As fichas apostadas foram altas demais e na cor errada.

Diante do bololô criado, quais foram as reações da candidata? Primeiro disse que não sabia de nada, como o Presidente Lula no caso do mensalão. Então tá. Quer dizer que durante os sete dias entre o primeiro turno e o início da campanha do segundo turno Marta Suplicy não teve nem tempo nem interesse em saber como seria a campanha preparada por seus marketeiros - e que tampouco tem nenhuma influência sobre o seu conteúdo? Pode até ser verdade, mas é duro de acreditar! De todas formas, se delegou cegamente em terceiros, nem assim deixa de ser responsável, afinal a candidata é ela e a campanha é dela. Diga o que disser, quem ficará marcada por essa baixaria é ela mesma. Depois, claro, tentaram botar a culpa nos outros, uma reação típica dos políticos do PT quando as coisas saem erradas. Provavelmente esta reação foi mais irritante e contraprodutiva do que a primeira. Quer dizer que perguntar se o prefeito é casado e tem filhos é mesmo uma perguntinha inocente como qualquer outra, como quem pergunta que horas são? Se eles querem chamar os eleitores de idiotas, porque não o fazem diretamente, ao invés de tentar justificar o injustificável?

O descrito acima foi um erro. Grosseiro, de baixo nível e caro, é verdade, mas nada mais que um erro. Interessante mesmo é a tentativa de descontrução de Kassab, segundo jargão dos petistas. Apesar do prefeito ser jovem demais para ter apoiado a ditadura militar, tentam identificá-lo com a Arena, o partido dos militares. O DEM é sucessor do PFL, que é uma excisão da Arena. Portanto Kassab está ligado não só à ditadura militar, como também aos coronéis do nordeste, além de Maluf e Pitta. A última ligação é verdadeira, mas daí dizer que ele será tão mau prefeito quanto Pitta ou que é imprevisível, que elegê-lo é dar um cheque em branco, há um salto de trampolim. Afinal, o prefeito está no cargo há mais de dois anos e dá para saber se ele é igual, melhor ou pior do que o Pitta - e que a Marta. E depois de dois anos não há realmente um cheque em branco. É claro que o prefeito pode mudar completamente de comportamento se fôr re-eleito, mas qualquer político pode. Para nossa sorte, o caso mais notório é o do próprio Presidente Lula que, uma vez no poder, seguiu a política econômica do seu antecessor, contrariando o que tinha dito durante vinte anos na oposição.

Duas coisas chamam a atenção na estratégia de descontrução: primeiro, dizer que o DEM é sucessor da Arena. Quem era o Presidente da Arena durante a ditadura militar? José Sarney, um dos mais importantes aliados do Governo Lula. Até Maluf, deputado federal, é da base de apoio do Presidente Lula. Então, como é que fica? Se é para apoiar o Presidente em nível nacional não importa o DNA dos políticos, mas se é adversário em São Paulo então tem toda importância do mundo? Sei, mais uma vez é a lógica peculiar da esquerda que se acha dona da verdade e única defensora do bom e do bem.

Na minha opinião a estratégia de DNA político pode ser outro tiro no pé. Dizem que o Presidente Lula quer como candidata à sua sucessão uma senhora que foi guerrilheira, militante de um grupo terrorista que não apenas queria derrubar o regime militar, mas que também buscava instaurar um regime popular no país, que é o apelido que a esquerda dá para ditaduras comunistas, como a dos irmãos Castro em Cuba. Imaginem se na campanha eleitoral de 2010 os adversários perguntarem por exemplo se esta senhora matou alguém quando era guerrilheira. Ia ser o fim do mundo. Todos cairiam de pau, dizendo que isso é tática nazista (a esquerda gosta de fazer este erro histórico, chamando tudo de que não gosta de fascista ou nazista). No entanto pela estratégia do DNA político dá para dizer muita coisa sobre esta possível candidata: elegê-la seria assinar um cheque em branco, quem pode garantir que ela abandonou as convicções de juventude, que não tentará implantar uma ditadura comunista no Brasil e muita bobagem mais? Sei que tudo isso seria baixaria. Mas porque seria baixaria só contra a candidata preferida do Presidente e não é contra o prefeito Kassab?

Por fim está em circulação uma teoria, defendida com dados por gente muito séria, de que as duas vezes que o PT elegeu prefeitas na cidade de São Paulo, só aconteceu porque contou com o voto anti-Maluf. Uma vez extinto o fenômeno Maluf (já era mais do que hora), o PT teria um teto eleitoral de 40%. O que antes era voto anti-Maluf agora seria voto anti-PT. A argumentação tem lógica. Pessoalmente posso dizer que a única vez que votei no PT foi para eleger Luiza Erundina. Melhor dito, foi para que Maluf não ganhasse. Quando Marta Suplicy foi eleita já não morava por aqui, não posso opinar.

Minha interpretação é um pouco diferente. Creio que as duas últimas eleições demonstraram que os eleitores estão aos poucos aposentando os políticos remanescentes da época da ditadura militar. Delfim Netto não se re-elegeu deputado federal em 2006 e agora Maluf teve menos de 5% dos votos para prefeito. Há ainda muita gente para ser aposentada pelos eleitores, mas é possível que em alguns casos a natureza seja mais rápida, tendo em vista sua idade. Os eleitores não estão aposentando apenas as pessoas, mas também as idéias. O velho maniqueismo de que todos que estiveram contra a ditadura militar eram os bons e os que estavam a favor eram os vilões tem cada vez menos sentido. Continuar defendendo as velhas idéias da esquerda caquética que ficou com a cabeça parada na década de cinquenta do século passado também tem seus dias contados. Não só porque os dinossauros da esquerda terceiro-mundista, amiga de Cuba, Cepalina estão cada vez mais velhos, mas principalmente porque estas idéias simplesmente já não servem mais. O mundo mudou muito nos últimos 60 anos, só as Carolinas auto-proclamadas progressistas é que não viram!

Quando dizem que há um voto anti-PT em São Paulo, eu discordo. Acho que em São Paulo há um voto anti- esquerda pré-histórica. Para entender o que digo, basta comparar o discurso dos petistas e aliados com o de socialistas europeus. A diferença é brutal! Mais uma vez me permito citar o meu caso: aqui nunca votaria nas bobagens defendidas pelas nossas esquerdas; na Espanha voto no Partido Socialista. Não é nenhuma contradição, os socialistas espanhóis estão muito mais perto dos Tucanos do que dos petistas e companheiros. Os trabalhistas do Blair então, é como o dia e a noite.

Para mim o que o eleitor está pedindo é renovação, de pessoas e idéias. Suspeito que esta vai ser a chave das eleições de 2010. Os diversos partidos políticos deveriam tomar nota.

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